sexta-feira, 16 de janeiro de 2009

Ruína Filarmônica

Finalmente, meses de ensaio seriam testados nessa noite, e tudo seria perfeito. Se desse certo, ele conquistaria a cidade, o país, e depois: o mundo. Seria reconhecido como o grande maestro que era: novo e talentoso.

Ele pensa isso enquanto sobe ao palco. Cumprimenta os músicos, e faz uma saudação para a platéia. Suas pernas ameaçam tremer e sua testa começa a suar. Casa cheia.

Dá as costas à platéia e olha para os seus músicos. Respira fundo, pisca os olhos com força e começa a fazer o que sabe de melhor: o seu trabalho. A primeira música começa, soa perfeita, nenhuma variação, nada além da mais bela sinfonia.

O jovem maestro ouve os aplausos da platéia, vira-se, e faz uma reverência. Ele mal pode conter tamanha felicidade. Volta-se para o palco e começa a segunda música. Olha cada um dos seus músicos nos olhos, e ali vê profissionais.

A violinista loira, sempre insegura, parece forte e decidida. Os tenores, que não gostam uns dos outros, ressoam como uma só voz. Até o gordo do tambor está fazendo tudo certo, mesmo que, duas semanas atrás, ele tenha flagrado o maestro com a sua namorada. Mas, naquela apresentação, mostrou que eram águas passadas.

A segunda música se encerra sem nenhum erro. Ele olha a platéia, agradece e, sem conseguir tirar o sorriso bobo do rosto, volta-se para os seus músicos. Então começa a terceira música, a sua preferida.

A música soa sem nenhum erro. E ele percorre novamente os seus músicos. O contra-baixo está perfeito, como tudo. Mas, ao passar os seus olhos pelo gordo do tambor, ele para. E então, repara que ele também o olha nos olhos. Aquele homem de camisa apertada e cabelo bagunçado sorri. E o jovem maestro treme.

Não há tambor nessa música. Mas o gordo mexe as mãos. Estica o mindinho da direita. E começa a levantar a mão. O maestro apenas assiste, impedido de qualquer reação. Repara em como aquele mindinho tem uma unha maleficamente comprida. Repara também como os dentes do músico se mostram quando ele escancara ainda mais o sorriso. E, para o horror do jovem maestro, o gordo do tambor limpa o vão dos dentes com a unha do mindinho. Mexendo para cima e para baixo, vagarosamente. E depois, descendo o dedo para limpar na camisa.

É o fim, o maestro sabe disso. Ele falhou. Sabe que a platéia deve ter visto e começa a imaginá-los comentando. E, assim, o maestro perde as forças. Baixa a cabeça. A vareta para de se mexer, e toda a orquestra desanda. Os outros músicos se surpreendem com a súbita tristeza do, sempre animado, maestro na sua música preferida. Também se surpreendem quando o gordo, calado a semanas, começa a gargalhar alto.

2 comentários:

  1. Sempre tem a frase, ou o momendoto, da virada inesperada nos teus textos... Andei reparando... Quanto ao Ronny Klayton... meu deus, isso não é nome, isso é sentença

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