terça-feira, 4 de janeiro de 2011

Réveillon

O ano novo se aproximava do litoral enquanto um homem esperava atrás de sua mesa de escritório, bebendo seu café e fumando seu cigarro. Suas únicas companhia eram uma calculadora, uma pilha de papéis, uma caneta e um estranho instrumento.

Tomou alguns goles de café e se preparou para o trabalho que teria. Não se importava de trabalhar na virada, o problema era a quantidade. Faz isso apenas uma vez ao ano, mas tem um pavor pessoal da tarefa.

Olhou no relógio e decidiu que tinha tempo. Levantou e andou pelo velho escritório, mal iluminado e com tábuas rangendo ao passar. Parou ao lado da janela e olhou a noite enquanto tragava seu cigarro.

Foi interrompido pela agulha do instrumento, que começou a riscar uma longa folha de papel, como uma espécie de medidor de tremores. Ele suspirou e voltou para a mesa.

Mesmo sem ser meia noite, pelo visto, alguns já haviam começado as comemorações. Pegou a calculadora e começou a fazer contas e tomar notas em suas folhas.

Mesmo que sua chefe falasse para se atualizar, arranjar um computador ou um smart phone, ele preferia a calculadora e o papel. Dizia confiar mais na sua própria habilidade do que na tecnologia de outra pessoa.

Faltavam 5 minutos para meia noite, e o instrumento já riscava constantemente. O homem escrevia números e nomes com uma velocidade incrível com a mão direita, enquanto a esquerda fazia contas na calculadora.

Conseguiu liberar a esquerda para um rápido gole de café, e voltou ao trabalho. Lendo gráficos, analisando dados e anotando resultados.

Com apenas 2 minutos para a meia noite, a longa folha do instrumento já se amontoava no chão, aos pés da mesa. Ele havia feito algumas marcas nela, com trechos duvidosos, que consultaria depois. Pelo visto, seu pós-réveillon também seria trabalhoso.

Olhou para o relógio na parede, e imaginou as pessoas fazendo a contagem regressiva para a verdadeira virada. Faltando 10 segundos deu um rápido suspiro, e com 5 segundos a máquina já rabiscava metros de folha por minuto. Abaixou a cabeça, e continuou fazendo contas e tomando notas com uma velocidade extraordinária.

Pensou que, se alguém o visse naquela hora, o tomaria como um ser mítico, um contador do sobrenatural. Imaginou se algum dia contariam alguma lenda sobre ele, se acenderiam vela ou rezariam para receber ajuda em algum complicado problema de matemática. Sorriu com o pensamento.

E foi assim que, pela primeira vez, o Contador de Iemanjá – responsável por anotar o numero de ondas que cada um pula na virada – entrou em um ano com um sorriso no rosto. Nada muito grande. Mas, ainda assim, um sorriso.

Feliz 2011.